Consumismo
“Os limites ao crescimento esbarram nas ações fortemente arraigadas numa ditadura que valoriza a noção central do consumo conspícuo.”

Pelas lentes exclusivas das Ciências Econômicas, o desempenho econômico das nações modernas pode ser medido, grosso modo, levando-se em consideração dois aspectos: 1. A promoção do aumento substancial da renda per capita e familiar e, 2. Estimular mecanismos que asseguram por todos os meios às possibilidades de promoção de continuidade da vida digna e plena.

A primeira condição é de amplo conhecimento de qualquer economista e, por sinal, não é tão difícil promovê-la. Em relação ao segundo aspecto, alguns economistas tem tido certa dificuldade em assimilar tal possibilidade, uma vez que é comum aos que seguem o receituário neoclássico ignorar as leis da natureza, dado o distanciamento existente entre os fundamentos da teoria econômica em relação às ciências naturais, notadamente à ecologia.

Ademais, é necessário entender, primeiramente, que no “dicionário da vida”, desenvolvimento significa organizar socialmente a economia para efetivar-se acesso ao mínimo indispensável para bem viver.

Em matéria de qualidade de vida, para aqueles que não foram infectados pelo “vírus do crescimento econômico”, parece não haver dúvidas que o mais importante não é atingir o crescimento (puramente em termos quantitativos), mas sim alcançar a ordem dos fatores qualitativos (desenvolvimento). É aqui então que entra em discussão à questão econômica (as leis da economia) relacionada à questão ecológica (as leis da natureza).

Para isso, não é mais possível obedecer cegamente à ordem que impera na macroeconomia tradicional. A lei básica dos compêndios macroeconômicos, endossada pelas teorias keynesiana e neoclássica, sempre recomendou buscar o aumento incessante do consumo, visando atingir com isso mais crescimento. É a estapafúrdia ideia da mania do crescimento – a growthmania, nos dizeres do economista inglês Ezra Mishan que consagrou e criticou esse termo na obra The Costs of Economic Growth, de 1967.

Já a receita ecológica é um pouco mais simplista, porém, não menos objetiva: deve-se respeitar as leis da natureza para assegurar possibilidade de vida com qualidade.

O ponto central, nessa seara, é que para promover real e substancial qualidade de vida o sistema econômico não necessariamente precisa aumentar de tamanho. Não é preciso expandir a economia – aumentar a produção econômica para proporcionar vida melhor para as pessoas.

Não há nisso nenhuma magia. Basta apenas promover uma distribuição equânime daquilo tudo que já foi produzido, rompendo, assim, com a chamada “concentração”, essa erva daninha que infesta o cenário econômico em diferentes frentes.

Logo, não necessariamente a economia precisa aumentar de tamanho, produzindo mais, referendando assim a estreita visão materialista de “adquirir mais”, até mesmo porque há limites biofísicos para a expansão econômica.

Do lado das economias mais dinâmicas, os limites ao crescimento esbarram nas ações fortemente arraigadas numa ditadura que valoriza a noção central do consumo conspícuo.

Um impedimento real disso encontra-se na própria dinâmica do capitalismo. Enquanto essa dinâmica tacanha estiver balizada e endossada na criação de necessidades materiais e, muitas vezes superficiais, será difícil levar adiante a noção central de que toda e qualquer atividade econômica apresenta limites.

O erro mais comum da macroeconomia tradicional está em ignorar os limites biofísicos, fazendo vistas grossas à dependência do sistema econômico em relação aos fatores da natureza.

Ora, que fique claro essa assertiva: o processo econômico não pode funcionar sem uma troca contínua com o meio ambiente. Nenhum sistema econômico pode sobreviver sem um aporte contínuo de energia e de matéria (recursos naturais).

Lamentavelmente, os ensinamentos neoclássicos ignoram tal premissa e insistem nas vias de um crescimento econômico contínuo como forma única e exclusiva de proporcionar bem-estar.

Os que ainda insistem em ignorar a questão ambiental – enaltecendo a dinâmica do crescimento econômico a qualquer custo – não se deram conta que a atmosfera do planeta está abafada, segundo dados do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), por um manto de gás com 800 bilhões de toneladas de carbono.

Não se pode ignorar que isso provocará até 2030 a elevação da temperatura em mais 2° Celsius, acarretando enormes perdas dos serviços ecossistêmicos, comprometendo o próprio dinamismo econômico. A atividade econômica, na sanha em aumentar a quantidade de mercadorias produzidas, contribui substancialmente para essa contínua agressão ao meio ambiente, aquecendo mais ainda o planeta. No final, todos nós pagaremos o preço desse descaso.

* Marcus Eduardo de Oliveira é economista, especialista em Política Internacional e Mestre em Integração da América Latina (USP).

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