O diretor sumiu
Em artigo publicado originalmente na Folha de São Paulo a ex-ministra de Dilma questiona a mudança de política do novo mandato.

Tenho pensado muito sobre a delicadeza e a importância da transparência nos dias de hoje. Temos vivido crises de todos os tipos: crise econômica, política, moral, ética, hídrica, energética e institucional. Todas elas foram gestadas pela ausência de transparência, de confiança e de credibilidade.

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Se tivesse havido transparência na condução da economia no governo Dilma, dificilmente a presidente teria aprofundado os erros que nos trouxeram a esta situação de descalabro. Não estaríamos agora tendo de viver o aumento desmedido das tarifas, a volta do desemprego, a diminuição de direitos trabalhistas, a inflação, o aumento consecutivo dos juros, a falta de investimentos e o aumento de impostos, fazendo a vaca engasgar de tanto tossir.

Assim que a presidenta foi eleita, seu discurso de posse acompanhou o otimismo e reiterou os compromissos da campanha eleitoral: “Nem que a vaca tussa!”.

Havia uma grande expectativa a respeito do perfil da equipe econômica que a presidenta Dilma Rousseff escolheria. Sem nenhuma explicação, nomeia-se um ministro da Fazenda que agradaria ao mercado e à oposição. O simpatizante do PT não entende o porquê. Se tudo ia bem, era necessário alguém para implementar ajustes e medidas tão duras e negadas na campanha? Nenhuma explicação.

Imagina-se que a presidenta apoie o ministro da Fazenda e os demais integrantes da equipe econômica. É óbvio que ela sabe o tamanho das maldades que estão sendo implementadas para consertar a situação que, na realidade, não é nada rósea como foi apresentada na eleição. Mas não se tem certeza. Ela logo desautoriza a primeira fala de um membro da equipe. Depois silencia. A situação persiste sem clareza sobre o que pensa a presidenta.

Iniciam-se medidas de um processo doloroso de recuperação de um Brasil em crise. Até onde ela se propõe a ir? Até onde vai o apoio à equipe econômica?

Para desestabilizar mais um pouco a situação, a Fundação Perseu Abramo, do PT, critica as medidas anunciadas, o partido não apoia as decisões do governo e alguns deputados petistas vociferam contra elas. Parte da oposição, por receio de se identificar com a dureza das medidas, perde o rumo criticando o que antes preconizou.

O PT vive situação complexa, pois embarcou no circo de malabarismos econômicos, prometeu, durante a campanha, um futuro sem agruras, omitiu-se na apresentação de um projeto de nação para o país, mas agora está atarantado sob sérias denúncias de corrupção.

Nada foi explicado ao povo brasileiro, que já sente e sofre as consequências e acompanha atônito um estado de total ausência de transparência, absoluta incoerência entre a fala e o fazer, o que leva à falta de credibilidade e confiança.

É o que o mercado tem vivido e, por isso, não investe. O empresariado percebe a situação e começa a desempregar. O povo, que não é bobo, desconfia e gasta menos para ver se entende para onde vai o Brasil e seu futuro.

Acrescentem-se a esse quadro a falta de energia e de água, o trânsito congestionado, os ônibus e metrôs entupidos, as ameaças de desemprego na família, a queda do poder aquisitivo, a violência crescente, o acesso à saúde longe de vista e as obrigações financeiras de começo de ano e o palco está pronto.

A peça se desenrola com enredo atrapalhado e incompreensível. O diretor sumiu.

*Este artigo originalmente publicado na Folha de São Paulo

**Marta Suplicy foi senadora pelo PT, prefeita de São Paulo e Ministra da Cultura no primeiro mandato da Presidente Dilma Rousseff

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