Impacto social de investimentos: uma visão míope?
Ricardo Zibas*
Companhias ao redor do mundo e suas fundações investem bilhões de dólares, todos os anos, em programas sociais e ONGs com o objetivo de endereçar os grandes desafios globais, como a redução da desigualdade social, acesso à educação, saúde, combate a desastres naturais, mudanças climáticas e muito mais. Mas será que é possível afirmar, com certeza, quem se beneficia destes investimentos e quantificar isto? Será que as empresas entendem o real valor de suas ações em cidadania corporativa?
Uma recente pesquisa da KPMG (denominada Unlocking the value of social investment), produzida através dos dados de investimento social das 100 maiores empresas globais, aponta que as organizações focam na medição dos valores que foram destinados a estas iniciativas (inputs e outputs), tais como contribuições filantrópicas, doações de produtos e voluntariado, mas o reporte dos impactos destes investimentos é algo raro.
A primeira dificuldade é a terminologia. Afinal, o que queremos dizer com investimento social? Neste sentido os relatórios são confusos: alguns utilizam o termo “filantropia”, outros, “doações”, muitos falam em “responsabilidade social corporativa” ou ainda “programas comunitários” ou “contribuições sociais”. Para efeito desta pesquisa, consideramos o termo “investimento social” como sendo qualquer contribuição feita por uma organização para a sociedade que não tem como motivação primordial a geração de um retorno financeiro direto.
Foram analisadas as informações públicas de empresas atuantes em 10 setores (automotivo, químico, finanças / seguros, alimentos / bebidas, mineração / siderurgia, óleo / gás, farmacêutico, telecomunicações / eletrônicos, transporte e energia) com sedes em 11 países (Austrália, Brasil, China, Alemanha, Itália, Japão, Holanda, Coréia do Sul, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos).
Os principais pontos verificados demonstram que os orçamentos destinados para este fim são significantes: no universo de 100 empresas estudadas, o total de investimentos sociais foi de 12 bilhões de dólares em 2013. Em média, as empresas investem em média 2,5% de seu lucro bruto em programas sociais, sendo que o setor industrial que mais contribui é o farmacêutico (cerca de 12% do lucro bruto), dado o alto valor agregado existente na doação de remédios.
O segundo ponto é que os relatórios divulgados focam no que foi investido (como, por exemplo, dinheiro destinado à educação) e o produto deste investimento (número de crianças matriculadas), mas quase nada é mencionado ou quantificado sobre os impactos deste investimento.
A terceira característica é a dispersão. Apenas um terço das empresas demonstra ter uma estratégia focada para os seus programas sociais. Em média, as organizações investem em cinco áreas distintas ao invés de priorizar as ações. Esta falta de foco atua como um complicador para que os resultados dos investimentos sejam maximizados e tangibilizados.
De uma forma resumida, os principais desafios apontados para a mensuração dos impactos se referem ao grande número de padrões e ferramentas existentes que não são compatíveis entre si, o custo desta avaliação, a complexidade envolvida na tarefa de quantificá-los, a falta de transparência na forma que os recursos são gastos, especialmente quando são confiados a terceiros, e a abordagem descentralizada, que não prioriza uma área específica de atuação.
Medir e reportar o impacto social de investimentos é uma tarefa complexa e desafiadora, sem sombra de dúvida. Não existe um padrão universalmente aceito para coletar dados e analisá-los. Uma estratégia clara e coerente de investimento é o primeiro passo para este entendimento, que pode fornecer subsídios para monitorar a efetividade das iniciativas e refinar a alocação dos recursos para onde eles realmente fazem a diferença na vida das pessoas.
*Ricardo Zibas é sócio-diretor da área de Mudanças Climáticas e Sustentabilidade da KPMG no Brasil.
Comentários
Ainda não há nenhum comentário para esta publicação. Registre-se ou faça login e seja o primeiro a comentar.