Novas fontes limpas de energia ganham mais espaço no Brasil
Com forte abundância de recursos naturais, o Brasil tem tradição no aproveitamento de fontes limpas para a produção de energia elétrica. Elas representam cerca de 90% do total, com destaque para as hidrelétricas, (com mais da metade do percentual), mas também para a biomassa, utilizada nas termelétricas. Porém, com o incentivo do governo federal para a diversificação da matriz, as energias eólica e solar vêm surgindo como alternativas.
Atualmente, a energia eólica representa cerca de 6% da matriz energética brasileira e a solar chega a 0,02%. Por outro lado, a fonte proveniente do sol tem um destaque muito maior na geração distribuída ou microgeração, que é a energia elétrica produzida pelos consumidores em casas ou empresas. Nesse segmento, a eólica ainda não despontou.
No entanto, ambas possuem forte potencial de crescimento para os próximos anos, o que vem desenvolvendo as empresas que atuam no setor e criando uma grande cadeia de suprimentos. Com isso, são milhares de empregos gerados e forte investimento em novas tecnologias que tornarão o Brasil uma potência no setor.
A consolidação da energia eólica no Brasil
A matriz energética brasileira conta, hoje, com 9 gigawatts de energia eólica instalada. Em termos de geração efetiva, corresponde a uma usina de Belo Monte. Segundo a edição mais recente do Boletim Mensal de Monitoramento do Sistema Elétrico, do Ministério de Minas e Energia, a capacidade instalada cresceu 56,9%, considerando o período de 12 meses encerrado em novembro de 2015 ante os 12 meses anteriores.
Em 2014, o Brasil foi o quarto país do mundo que mais expandiu sua capacidade eólica. As nações que avançaram mais que o Brasil em 2014 foram a China (23.149 megawatts), Alemanha (6.184 MW) e Estados Unidos (4.854 MW).
No ano passado, o setor empregou cerca de 40 mil pessoas. Para este ano, a estimativa é que o número chegue a 50 mil, com um aumento de 32%. Em investimentos, foram R$ 22 bilhões em 2015, com expectativa de receber outros R$ 25 bilhões em 2016.
Somente em 2015, foram inauguradas mais de 100 usinas eólicas no Brasil, chegando a 361. Com esses investimentos, o país se tornou o 10º maior gerador deste tipo de energia no mundo, superando países como Portugal e Suécia, segundo Ranking Mundial de Energia e Socioeconomia.
A inauguração mais recente foi do Complexo Eólico Chapada do Piauí, localizado nos municípios de Marcolândia, Simões, Padre Marcos e Caldeirão Grande. Os investimentos são estimados em R$ 1,85 bilhão. As instalações têm capacidade instalada de 436,6 MW, o suficiente para gerar energia para mais de um milhão de residências.
O crescimento da participação da energia eólica na matriz elétrica brasileira começou em 2009. Segundo a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica, Elbia Gannoum, a principal motivação foi o aumento da competitividade, proporcionado pela evolução da tecnologia e o maior conhecimento do Brasil a respeito do seu potencial de vento.
Hoje, segundo a presidente da Abeólica, o Brasil tem a energia eólica mais barata do mundo e, dentro do país, a segunda fonte mais competitiva, perdendo apenas para a hidrelétrica. A explicação para isso está na combinação do recurso de vento brasileiro, que é o melhor do mundo, com uma tecnologia que aumenta a produtividade e reduz os custos dos equipamentos, que representam de 70% a 80% do orçamento de um parque eólico. “Na Europa, a produtividade por máquina está em torno de 28% a 30%. No Brasil, temos mais de 50%. Então, de onde eu tiro 30% de energia na Alemanha, tiro 50% aqui, o que torna o custo mais baixo, justamente pela natureza do vento”, explica Elbia.
No Brasil, o vento é abundante, forte, constante e grande parte unidirecional. “Você instala a máquina e ela estará sempre produzindo”, diz a presidente. Em outros países, a velocidade média é de 6 metros por segundo. Enquanto no Brasil, varia de 10 a 12.
Boa parte das empresas que operam a energia eólica no Brasil ainda são de fora. No entanto, por exigência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que exige um certo grau de nacionalização em troca de financiamento, elas estão produzindo e começando a desenvolver tecnologia dentro do país.
Essa vinda de empresas de fora para dentro do Brasil acabou desenvolvendo e fortalecendo uma cadeia produtiva e de fornecedores. “Isso é algo que está até passando por uma fase de consolidação”, avalia Elbia.
Com tudo isso, o futuro dessa energia por aqui é promissor. Até 2019, pela capacidade que já está contratada, a produção deve chegar a 18 GW. Segundo Plano Decenal de Energia Elétrica 2024 (PDE 2024), essa fonte será responsável por 24 GW até 2024, chegando a 11,1% da matriz elétrica.
O futuro da energia solar no Brasil
Ao contrário da energia eólica, a solar vem se destacando no segmento de geração distribuída ou microgeração. Isso começou em 2012, quando a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) estabeleceu uma resolução permitindo que os consumidores, pessoas ou empresas, instalem equipamentos para produzir a própria energia de fonte renovável.
A partir do momento que essa resolução passou a valer, a energia solar passou a ser a líder do mercado, com um crescimento muito rápido. O número de sistemas instalados passou de 3 em 2012 para 75 em 2013, chegando a 424 em 2014 e atingindo a marca de 1731 no ano passado.
Uma das explicações para essa liderança, segundo o presidente da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Rodrigo Lopes Saauia, é o fato de a fonte solar ser a mais versátil e bem distribuída no país. “Qualquer pessoa tem um pouquinho de sol no telhado ou na fachada pode gerar energia solar”, atesta Saauia.
Além da versatilidade, há outros fatores que ajudam a explicar esse crescimento. Em 2015, o aumento das contas de luz, a chamada “realidade tarifária”, pela qual foi repassado ao consumidor o custo da geração de energia por meio das termoelétricas, ajudou nesse incremento.
O custo-benefício também é algo que chama a atenção dos consumidores. O investimento em um sistema de energia solar costuma ser pago em torno de seis a 12 anos, dependendo da região, condições de radiação e preço da energia elétrica na distribuidora. Junto a isso, a vida útil é de 25 anos, com garantia de fábrica. Nesse período, a manutenção é quase zero.
Dessa forma, de acordo com Carolina Reis, diretora comercial do Painel Solar, empresa responsável pela intermediação entre empresas e consumidores, as pessoas estão começando a olhar para os painéis fotovoltaicos não só como uma maneria sustentável de produzir a sua própria energia mas também com um investimento em seus bens.
Apesar desse rápido crescimento, ainda há muito espaço para esse tecnologia crescer entre os consumidores. Um dos empecilhos é a falta de financiamento. “Então, por isso, estamos negociando com bancos e existe um interesse muito grande do setor financeiro público e privado de apoiar o desenvolvimento de novas linhas de financiamento adequadas às características e necessidades da energia solar”, conta o presidente da Absolar. Esta seria, segundo ele, uma forma de viabilizar o interesse de pessoas e empresas na energia solar.
O número de empresas que atuam nesse segmento vem crescendo fortemente. Segundo Saauia, algumas dezenas surgem por mês no Brasil. “Isso mostra que o mercado tem identificado esse segmento como uma boa alternativa para o futuro”, aponta o presidente da entidade.
Esse interesse dos empresários estaria ligado ao abundante recurso natural do Brasil, que tem o dobro da média anual de radiação solar de países de clima temperado, como Alemanha e Japão. “O Brasil tem tudo para se tornar uma potência na área de energia solar fotovoltaica”, prevê Saauia.
Incentivo do governo federal
O Ministério de Minas e Energia (MME) lançou o Programa de Desenvolvimento da Geração Distribuída de Energia Elétrica (ProGD) para ampliar e aprofundar as ações de estímulo à geração de energia pelos próprios consumidores, com base nas fontes renováveis de energia (em especial a solar fotovoltaica). O programa pode movimentar pouco mais de R$ 100 bilhões em investimentos, até 2030.
Até 2030, 2,7 milhões de unidades consumidoras poderão ter energia gerada por elas mesmas, entre residência, comércios, indústrias e no setor agrícola, o que pode resultar em 23.500 MW (48 terawatts-hora produzidos) de energia limpa e renovável, o equivalente à metade da geração da Usina Hidrelétrica de Itaipu. Com isso, o Brasil pode evitar que sejam emitidos 29 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera.
Um dos pontos importantes previstos para estimular a geração de energia distribuída é a atualização dos Valores Anuais de Referência Específicos (VRES), em R$ 454,00 por megawatt-hora para a fonte solar fotovoltaica, e R$ 329,00 por MWh para a cogeração a gás natural. Esse valor define a remuneração paga pela distribuidora ao gerador pela energia que ele entregar à rede de distribuição, e sua atualização a um patamar competitivo aumenta a atratividade dessa oferta de energia.
O Programa também define mecanismo de atualização automática desse valor, anualmente pelo IPCA, durante vigência do contrato, garantindo manutenção dos custos. Atualmente, as empresas de distribuição de energia podem comprar até 10% de seu mercado de fontes de geração de energia distribuída, para compor seu portfólio.
O ProGD também prevê a estruturação de novos horizontes para a comercialização da energia gerada pelos consumidores-geradores no mercado livre, aumentando a energia comercializada nesse ambiente e permitindo a extensão de benefícios característicos do mercado livre para mais agentes. O ProGD prevê ações para simplificar o mecanismo de comercialização dessa energia no Ambiente de Contratação Livre.
Ainda no âmbito do ProGD, os ministérios de Minas e Energia e da Educação estudam projeto específico de instalação de sistemas de geração distribuída baseados em painéis fotovoltaicos para universidades e escolas técnicas federais, extensível a hospitais federais. Na proposta, que será aprofundada e estruturada pelo ProGD, as escolas técnicas desenvolverão como contrapartida cursos específicos destinados a preparar recursos humanos aptos a atender esse novo mercado da geração distribuída para projeto, instalação e manutenção.
Energia solar na matriz elétrica
Ao passo que vem se consolidando na geração distribuída, a energia solar ainda corre atrás, com grandes avanços, do seu espaço na matriz elétrica brasileira. O primeiro leilão que contratou energia solar no Brasil foi uma iniciativa do governo de Pernambuco e ocorreu em 2013, contratando 92 MW.
Depois disso, o governo federal enxergou a oportunidade e realizou o primeiro leilão nacional em 2014, contratando 1048 MW. No ano seguinte, foram mais dois leilões, um de 1043 e outro 1115,9 MW. Juntos, todos eles somam cerca de 3300 MW de potência contratada de energia solar.
Esses projetos serão instalados e começarão a operar entre 2017 e 2018. Com isso, a representatividade da energia solar na matriz elétrica brasileira vai saltar de 0,02% para algo em torno de 1% e 2%.
De acordo com o Plano Decenal de Energia Elétrica 2024 (PDE 2024), a geração de energia elétrica fotovoltaica alcançará 7 mil MW no Brasil até 2024, alcançando quase 4% da potência total brasileira.
Com essa nova demanda, a indústria do setor vive um momento de estabelecimento e estruturação no país. Alguns fabricantes já estão produzindo e outras empresas estão estruturando suas fábricas.
Por outro lado, os empreendimentos que trabalham nas áreas de engenharia e construção começarão a ser demandadas a partir de 2017, que é o ano em que esses projetos serão construídos de fato.
Um dos obstáculos que a energia solar enfrenta, segundo o presidente da Absolar, é a excessiva carga tributária em relação a outras fontes de energia, “o que está prejudicando a competitividade.”
Por isso, o principal pleito do setor é uma maior isonomia, ou seja, que o governo tanto federal quanto municipal “trate a energia solar sem discriminação, trate com os mesmos benefícios e as mesmas condições que as outras fontes já possuem.”
Nos últimos dez anos, devido aos avanços tecnológicos e melhorias no processo de produção, houve uma redução de custo de mais de 70%. Além disso, com o aumento de demanda no mundo inteiro e o crescimento no volume de produção, a tecnologia também vem se beneficiando de ganhos de escala. “São esses os fatores que fazem a energia solar ficar, a cada ano, cada mais barata, acessível e competitiva”, comenta Saauia.
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