“A diferença entre passar por essa crise e capotar lá na frente ou deslanchar é perceber as oportunidades, olhar os mercados.”
“A diferença entre passar por essa crise e capotar lá na frente ou deslanchar é perceber as oportunidades, olhar os mercados.”

Bacharel e mestre em economia pela Pontífica Universidade Católica (PUC-Rio), Luis Otavio Souza Leal atuou como economista-chefe na Câmara de comércio do Rio de Janeiro (Fecomércio-RJ) entre 2002 e 2004, foi professor assistente da PUC e em 2005 ingressou no Banco ABC Brasil, também como economista-chefe.

Juntamente com o diretor-gerente da Morgan Staley Brasil, Eduardo Freitag Miras, apresentou na Expogestão 2015 em Joinville (SC) uma sessão sobre Cenários e Tendências da economia e dos negócios atualmente.

Em entrevista ao portal O Economista, Luis Otávio falou da situação atual da economia do país, ressaltou as características cíclicas de uma crise econômica — destacando a importância da percepção de oportunidades e do planejamento para a retomada econômica que está por vir — e afirmou: Joaquim Levy é a pessoa mais indicada para fazer o ajuste fiscal.

O Economista – O senhor poderia fazer um avaliação da situação frente a desaceleração econômica e do ponto de vista dos bancos? E o ajuste atual é o caminho certo?

Luis Otavio Souza Leal – Bom, começando pela parte de economia. Efetivamente é chover no molhado dizer que a gente está passando por um momento difícil. O próprio ministro da Fazenda [Joaquim Levy] já falou isso, a presidente já falou isso, que a gente está passando por um período de ajuste necessário. Não tem como fugir disso. E as consequências desse ajuste estão sendo vistas na economia. Seja nas empresas tendo problemas, onde a gente vê um aumento grande de pedidos de recuperações judiciais no último trimestre, por exemplo, um crescimento médio de 55% no índice da provisão para devedores duvidosos (de acordo com o balanço divulgado pelos bancos). Isso é um aumento muito grande mostrando claramente uma deterioração do mercado de crédito. Então isso tem consequências não só para as micro e pequenas empresas, mas para empresas de todos os portes. O fato de você começar a ter essas linhas é importante para a economia como uma forma de alternativa de recursos e é uma forma inteligente do banco de aproveitar a oportunidade para entrar em algum segmento no qual não se entraria numa situação normal. É um momento de dificuldades, mas um momento de oportunidades dependendo de como você vê esse cenário. Mas sem dúvidas é um cenário bastante complicado. Não vai ser uma travessia fácil e nem curta, tem que se preparar. A gente trabalha no Banco ABC Brasil com uma previsão de uma queda de 0,7% no primeiro trimestre com relação ao trimestre anterior [o resultado oficial do IBGE ainda não tinha sido divulgado na hora da entrevista, confira aqui] e no ano algo entre -1,5 e -2%. Impossível nada é, mas acho muito difícil que a gente não tenha um ano de 2015 com crescimento negativo na economia brasileira.

E – Você fala que é um momento difícil, mas também de oportunidades. Quais são, do ponto de vista do sistema bancário, as garantias que se tem para atravessar essas turbulências?

LO – Sem dúvida nenhuma a primeira linha de defesa, que não é muito boa para as empresas, é aumentar as exigências, aumentar os requisitos de garantias. Os créditos ficam mais caros, os créditos ficam mais difíceis, mas isso é primeira linha de defesa. Mas uma outra coisa que os bancos vão começar a fazer, por conta do tipo de política implementada, de usar menos os bancos públicos e diminuir a participação deles, principalmente do BNDES, no mercado de créditos. O efeito colateral positivo que se pode ter nesse momento é um incremento no mercado de capitais. Emissão de debêntures, empréstimos sindicalizados etc. Esse tipo de opção de crédito para empresas pode acabar dependendo do tamanho, mas pode ficar mais barato que acessar o crédito bancário. E isso para os bancos é interessante porque eles não ficam expostos aos créditos ou à inadimplência, pois eles ganham a comissão. Eu acho que em todas as crises, se você fizer as coisas certas, eu acho que você sai dela mais fortalecido. Eu acho que uma das coisas boas que nós podemos ter no final desta é o fortalecimento do mercado de capitais, o que o próprio governo já vem tentando há algum tempo e ele não anda. O mercado de debêntures, por exemplo, que em todo lugar do mundo é uma fonte alternativa de crédito para as empresas, aqui no Brasil não vai pra frente.

E – E quais as razões disso?

LO – Uma das principais razões é que existe uma concorrência muito grande, que é a do BNDES. Ele acabava tomando o espaço que esse mercado de crédito tinha. Agora, você considerando que o próprio BNDES pensa em utilizar esse tipo de mecanismo para se financiar, acho que isso pode dar um certo gás nesse mercado. Outra coisa que sempre recebeu reclamações e a gente vai ter que primeiro começar a girar para ver acontecer, é ter um mercado secundário forte. Ou seja, o que trava um pouco esse mercado hoje em dia é que você compra um título desses, uma debêntures, por exemplo, e você tem pouco espaço para se livrar dela se você quiser. O mercado é muito estreito. Então você fica abraçado com aquele papel. E, principalmente para fundos de investimentos, que seriam os potenciais compradores de títulos, isso é muito ruim. Eles têm obrigações de liquidez com seus clientes e eles não podem ficar abraçados a um papel sem liquidez. Então a partir do momento em que você conseguir desenvolver este mercado secundário e com os aumentos das emissões, esse mercado acaba vindo a reboque.

E – Qual a sugestão, diante desse cenário e dessas possíveis alternativas, que você considera importante para uma média empresa, por exemplo?

LO – Nessa hora eu acho que a primeira coisa é racionalizar custos. Não falo necessariamente em reduzir mão de obra, mas adequar os custos à situação atual da demanda, ou seja, de receitas menores, mas estar preparado para ganhar market share quando essa recuperação começar de novo. Aí será o pulo do gato. A diferença entre passar por essa crise e capotar lá na frente ou deslanchar é perceber as oportunidades, olhar os mercados. Normalmente quando você tem essas situações de crise, você tem a oportunidade de comprar máquinas, equipamentos e infraestrutura muito mais baratos. A chave é se preparar para a recuperação. No Brasil, não é a primeira crise que nós passamos, provavelmente e infelizmente não será a última.

Você deve se fechar no sentido de ter uma postura defensiva no seu gerenciamento de custos, mas se abrir a opções. No fim da minha apresentação, no último slide eu uso uma frase do [Winston] Churchill [Primeiro Ministro inglês durante as duas guerras mundiais] que fala que “o pessimista vê problemas em todas as oportunidades e o otimista vê oportunidades em todos os problemas”. Ele ganhou guerras pensando assim. É nessas horas que você cresce. Historicamente as empresas que mais cresceram são as que aproveitaram oportunidades ou se reinventaram.

E – E quais são as alternativas agora?

LO – Com o dólar mais forte ante ao real a exportação pode ser uma oportunidade. Outra coisa também é fazer um gerenciamento financeiro primando pela liquidez. Você precisa pegar crédito talvez para capital de giro, mas não é o momento de se alavancar. Ser conservador e sensato na hora de tomar crédito e, nesse caso, gerar o próprio dinheiro. O gerenciamento financeiro é muito importante, pois se deve fazer a relação custo-benefício. Por um lado, você tem um dólar mais forte, por outro uma taxa de juros muito elevada. Talvez seja o momento de fazer o dinheiro girar e se preparar para investir no momento adequado. Mas, buscando uma outra frase, do livro Anna Karenina [romance russo de Liev Tolstói], “as famílias são felizes igualmente, mas cada uma é triste de sua própria maneira”, ou seja, cada empresa tem seus problemas. Na bonança todo mundo pode crescer, mas é agora que a gente vai separar os homens dos meninos.

E – E voltando a falar do governo, você acha que o ajuste fiscal está sendo feito da maneira certa? Qual a sua opinião sobre como ele está sendo aplicado?

LO – O ajuste fiscal é inevitável. É um ajuste doloroso, não é agradável, mas é necessário. Não é suficiente para voltar a crescer, mas é uma condição necessária. Sem ela não há a mínima condição da gente conseguir retomar um crescimento sustentável a médio ou longo prazo. Posto isso, se você perguntar para qualquer economista do mercado financeiro um nome que seria perfeito para conduzir um ajuste fiscal, provavelmente 11 de 10 diriam que é o Joaquim Levy. Não existe pessoa mais capacitada para fazer esse tipo de ajuste. Ele foi secretário do Tesouro na época do Fernando Henrique, foi secretário da Fazenda no Rio de Janeiro, conseguiu ajustar as contas do Rio e, eu como carioca, sei a dificuldade que deve ter sido fazer isso etc. Então não tenho dúvida de que o caminho que ele está traçando é o mais viável neste momento. O problema é que nem sempre o que a gente quer é o que a gente consegue. Isso significa que, certamente, quando Levy traçou as diretrizes básicas do ajuste fiscal dele, ele não contava com tantos problemas políticos. Então, se você me perguntar se o ajuste fiscal está sendo feito da melhor maneira possível, eu diria que não, mas porque não está sendo feito do jeito que deveria ser feito, não porque está sendo feito errado. Você pode notar todo o dia, uma notícia de que por falta de apoio político você teve alguma diminuição na redução de custos prevista nas medidas que o governo envia ao Congresso e por isso o Joaquim Levy acaba levantando algum imposto, como a CSLL sobre o lucro dos bancos, o IOF etc. Não está sendo feito da melhor maneira possível por questão política, mas acho que o Joaquim Levy é a pessoa indicada para fazer esse trabalho. Não tenho dúvida de que até onde deixarem ele conseguir aprovar as medidas que ele quer, ele vai entregar o que ele prometeu.

E – E quanto à recuperação esperada por quem se preparar, você aposta algum momento específico?

LO – Bom, essa pergunta vale milhões. É o mesmo que perguntar quanto será o dólar no final do ano. É muito difícil dizer. Posso dizer quando não vai ser. Acho que neste ano não há possibilidade de deslumbrar algum cenário mais alentador. Acho que se a gente fizer a coisa certa, principalmente andar com questões microeconômicas, como fortalecer a parte de concessões como de rodovias, ferrovias, aeroportos, petróleo etc., até o final do ano podemos estar começando um ciclo virtuoso de que, talvez no primeiro semestre de 2016, a gente já consiga ver uma luz no fim do túnel. Mas acho que chance de ter uma economia recuperando, não. Em 2016 a gente provavelmente vai ter um crescimento positivo porque estaremos saindo de uma recessão, mas crescimento efetivo mesmo, acho que a partir de 2017. Porém, se tudo correr bem, acho que 2016 vai ser um ano com um sentimento melhor.

    Leia Também

  • Educação financeira

    Economizando em Tempos de Crise: Dicas Práticas para Gerenciar suas Finanças

  • Cinco atividades de lazer que movimentam a economia das grandes cidades

  • Afinal, qual é o melhor curso Ancord?

Comentários

Aprenda a organizar suas finanças, entenda mais de economia para fazer seu dinheiro render e conheça investimentos para incrementar sua renda